EP. #4 Guînes / Licques / Andres / Balinghem/ Ardres / Autingues / Le Courgain / Guémy / Le Hamel /
►Que noite bem dormida, estava precisando e acho que agora definitivamente estou entrando no fuso. Acordei com um belo café da manhã feito pela Catherine. Depois de arrumar as coisas com muita calma fui agradecer a Catherine por toda a hospitalidade em me receber. Sempre agradecer quem atravessa seu caminho, assim me ensinou meu pai. Conversamos bastante e sinto que aos poucos, meu francês vai fluindo, ainda me falta muito vocabulário, mas já está dando para conversar fluentemente.
►Com todas as coisas localizadas definitivamente na bike, saber onde está o que é essencial, parti para o sul. Que coisa boa pegar estrada e não precisa nem dizer, o asfalto é diferente, a estrada é limpa e os motoristas lhe dão prioridade. Passei por muitas vilas, mas a maioria com a mesmas características, casinhas térreas com jardins bem cuidados.
►Minha primeira parada foi na vila de Ardres. Sempre que via uma igreja (curioso que toda igreja aqui tem um cemitério ao lado), paro não só para a conhecer, mas para supostamente carimbar o passaporte pelegrino. Assim foi na Eglise Notre Dame de Grâce – séc XVI, mas o problema é que quando a igreja está aberta, não tem ninguém para me receber, então sem carimbo. Fiz isso uma, duas vezes; cansei, desisti do carimbo. Até que me senti intrigado depois de um tempo e parei numa igreja na Commune de Quercamps, também não havia ninguém, entrei, rezei e na hora que estava saindo encontrei um senhor de carro.
►Voilà, uma alma viva! Perguntei onde poderia carimbar meu passaporte e ele me levou até uma casa ao lado onde uma senhora o fez.
►Assim, fiquei empolgado e na próxima vila parei novamente. Ninguém na igreja quando novamente aparece um sujeito de carro. Perguntei onde poderia carimbar meu passaporte e ele me levou a uma casa, parecia um salão de festas; de repente, começou a chegar um monte de gente, um atrás do outro falando francês rapidíssimo e querendo saber o que estava acontecendo. Me pegaram para Cristo, fizeram mil perguntas e não acreditaram quando falei que era brasileiro e estava indo a Roma – “mas é muito longe”. Enfim após uma busca inconstante, não achavam o tal do carimbo, assinaram e o dataram meu passaporte como uma honraria, a eles; agradeci, despedi e parti. Depois desse episódio, cheguei à conclusão que se não é comum para os europeus fazerem esse caminho a partir de Canterbury, quem diria para um brasileiro.
Licques seria minha próxima vila, nada diferente das últimas.
►Hoje o trajeto planejado era curto - talvez 50 ou 60 km, mas teve serrinha curta com inclinação 9% que deu mais emoção – aperitivo para Grand San Bernard.
Hoje, enquanto eu pedalava, via minha sombra projetada no asfalto e imaginava a bike, eu e todo o equipamento sendo uma coisa só. A pedalada vinha uniforme, sempre atento para me preservar de lesões. Hoje, coloquei minha joelheira patelar esquerda por precaução pela primeira vez, pois senti algo pouco diferente no pedal de ontem. Não quero correr riscos, tenho remédio para tudo, mas não quero utilizá-los, quero que seja uma cicloviagem harmoniosa de corpo e alma. Amanhã, vou dar a minha primeira estilingada de 75 km até Arras, pretendo descansar dois dias na Diocese de Arras.
Chegando a Wisques, não estava certo de parar nessa vila, sabia que havia uma linda abadia já mencionada pelo meu amigo peregrino Marcos Bulcão em seu livro “O Filósofo Peregrino”. Fui até ela e fui recebido por uma freira, Madre Lucy. Assim que me viu, perguntou se eu estava com fome, imagina? Me fez entrar, pois o prato na mesa, o vinho e a água. Come! Devorei tudo com direito a uma tábua de queijos sortidos. Perguntou se queria ficar para dormir, aceitei, quero descansar, falta pouco para ajustar meu fuso. Levou-me para uma casa ao lado da Abadia, acredito que aqui é um lugar com paz espiritual, possui um belo jardim, e muitas corujas. Meu quarto é pequeno, mas aconchegante, tudo é simples, mas nesse momento não preciso de nada além desse simples.
►E a noite terminou aqui na Abadia com um jantar com um casal alemão, um italiano, uma francesa e a freira que falava italiano com o italiano, francês com os alemães, eu falava inglês com os italianos que falavam alemão entre si. Caraca, que mistura, isso dá um nó na cabeça!
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