PALMAS e PORTO NACIONAL, TO
Atualizado: 27 de jul. de 2021
Esses últimos dias em Tocantins têm sido especiais.
Acordei dia seguinte em Palmas depois de uma crise de tosse por ter respirado a fuligem da queimada que acontecia ao lado da pousada em Lajeado. Recuperado, passei uma noite a mais em Palmas onde tive um encontro emblemático. Meu primeiro contato foi com a Juliana, uma ciclista tocantinense de Palmas. Encontramo-nos em um shopping da cidade quando pedalava com seu marido, Monteiro, e mais um casal de amigos. Conversamos, contei-lhes algumas histórias sobre o projeto e nos despedimos.
Como sempre, um dia que antecede uma saída é um dia se preparação. Dá pra fazer tudo com muita calma, revisar equipamentos, lavar roupa, etc.
É muito difícil entrar numa roda de pedalar um dia após o outro sem pausas, sem descanso. O dia não rende em Tocantins. O pedal tem que ser muito cedo e encerrado no máximo até 10h30. O resto do dia eu uso pra me esticar, dormir a tarde, tentar comer razoavelmente bem e me recuperar.
Juliana e Monteiro encontraram-me cedo no dia seguinte, dessa vez, para me levarem gentilmente a uma bicicletaria para executar uma manutenção. Manutenção feita e barulhos indesejados do pedivela retirados, coube-me simplesmente agradecer ao gentil casal pela atenção dispensada.
Voltei ao hotel, quando recebi um convite de Juliana: jantar em sua casa. É simbólico adentrar à casa de qualquer um e, ainda mais ser recebido com um jantar, cuidadosamente pensado até no que se refere à porção do carboidrato e proteína para o tranco do dia seguinte.
A filha do casal chamava-se Ágatha, nome de origem grega como o meu, mas que significa boa, perfeita, respeitável. Encantadora menina, curiosa pela minha trajetória, entregou-me uma lembrança. Dois desenhos feitos e pintados, mais um pequeno terço feito com sementes de capim dourado. A cor da semente lembra ouro e dela é produzido artesanatos diversos como pulseiras, brincos, chaveiros, bolsas, cintos, vasos, etc. Isso não foi o bastante, junto ao ornamento, uma pequena dedicatória, que não pude ler na hora pela pouca iluminação e óculos.
O jantar terminou e mais uma vez despedimo-nos. Talvez para sempre? Não, não utilizo mais essa frase, para sempre. Na chegada ao hotel, aquela travada na garganta, assim como foi minha despedida de tantos outros queridos que deixei pelo caminho.
Subi para o quarto e a primeira ação foi buscar meus óculos. Sentei na cama e li o bilhete que assim dizia:
Desabei, comecei a chorar e me perguntar o que havia feito para receber essa honra tão pura e amorosa de uma criança. Tocar o coração de um pequeno é formidável. Passar uma mensagem positiva a alguém que deve ter muito mais esperança do que eu em meio a esse caos que vivenciamos, sem dúvida é um privilégio.
Não houve forma mais linda de me despedir de Palmas. Saí na manhã seguinte, bem disposto. Eram 5 h quando deixei o hotel rumo a Porto Nacional. Aos poucos Palmas e suas enormes avenidas foram ficando para trás. Meio à escuridão da madrugada e fugindo do risco físico da onda do calor alertado pelo Inmet, pedalei direção Sul.
Em uma estrada sem acostamento, com pouca elevação e muito caminhões cheguei a Porto Nacional depois de rodar 72 km.
Minha primeira ação foi me proteger do calorão. Já fazia 42 graus às 10h, quando adentrei em uma pousada simples, mas com ar-condicionado. Passei a tarde dormindo, descansando.
Fim de tarde saí pra conhecer o centro histórico de Porto Nacional, carregado de histórias e de uma belíssima catedral tombada pelo IPHAN.
Dormi bem, juro, talvez meu descanso mais profundo e em paz até aqui. Descanso de corpo e mente em harmonia com a expedição.
Sempre digo que o tamanho da expedição ou as características técnicas da bike são detalhes. O desafio de percorrer o Brasil não está só nos limites da sua quilometragem ou dos equipamentos adequados. É duro despedir-me a cada dia, dos lugares e principalmente das pessoas que estendem a mão, como a família Monteiro ou tantos outros.
Dividir bons momentos, boas conversas e o que é ou pode ser visto como belo é uma forma de unir todos a um ideal de um mundo menos ganancioso e mais otimista.
Essa esperança, vinda das palavras de uma criança, é o que me impulsiona e me faz girar há 8 anos, atrás de mais realizações e da integração de todos mais harmonia e menos diferenças.
Ágatha, obrigado pelas suas palavras e pelos seus ensinamentos! Obrigado Tocantins!
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